segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Não registado


Este registo pode muito bem ter utilidade unicamente para mim próprio. Sendo feito, pode também denotar uma qualquer necessidade de expurgar uma ou outra coisa, ou de fazer o lugar do que tiver sido deixado por fazer.
Deixar coisas registadas, pode ser de uma complexidade insuspeita. As coisas, quando são encontradas, tendem a deixar-se ser lidas no estado em que se encontram, e pelo espírito em que são encontradas.
Pode haver, sendo levadas em conta estas considerações, outros motivos para o registo do que não fotografei. Em qualquer caso, o que importa agora é dizer que: - Registo o que não fotografei porque preciso de não esquecer os motivos que inevitavelmente me induzirão raciocínios que não deixarei de expressar.
- Confuso? Também para mim.
Então, as fotografias que (recentemente) não fiz, foram:
Uma belíssima jovem asiática lavada em lágrimas, no museu do Louvre, por se ter sentido perdida do grupo, por um lapso de tempo algo maior que o necessário para olhar em redor mais do que duas ou três vezes sem encontrar um rosto familiar; imaginei eu.
Um latagão na casa dos cinquenta, sentado no chão à chinês na Rue Halévy, de olhar ausente e desfocado, na companhia de uma lata vazia e de um pequeno papel que dizia – j’ai faim – senti que a qualquer momento aqueles olhos se poderiam voltar para a pobre lente da Olympus quase sem bateria.
Chãos cobertos de pontas de cigarros fumados até aos filtros, às portas de edifícios altos e aparentemente vazios, quais mares de pequenas rolhas usadas em minicontentores de vidro para sonhos repetitivos e obrigatórios.
Túneis de metro bafientos e com curvas apertadas, como os de verme.
Uma cigana que está sentada no Boulevard des Italiens, em frente do restaurante da Pizza Hut, e vai mudando as fraldas aos putos que o marido lhe traz à vez, depois de os ter ido levar a ver pessoas a comer nos restaurantes.
Foi isto, basicamente, e com o tempo dará os seus frutos.


JMP

2 comentários:

  1. Penso que este excelente texto consegue descrever muito bem essas fotografias não tiradas. Sendo assim, ficou colmatada a lacuna. :))
    Aquele abraço

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    1. Obrigado, Luciano. É para isso que servem os amigos.
      Abração.

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